quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Tu do. Nada. Ah.


       Meu rosto já não é mais um rosto. É um Nada. A estrada que caminho agora se dobra como uma língua gigante. Os carros sorriem. A árvores se mesclam e seus galhos formam braços assustadores. Na poça de água, a sujeira se transforma em pequenas cobras. Os cães, os sapos e todos os animais são tão geniais que acabo me vendo como um deles. Me transformo em cão. Me transformo em sapo. Já não tenho mais nome. Já não tenho mais tempo. Tempo não existe. Horas, minutos e segundos me parecem uma invenção muito engraçada e sem sentido. Tudo faz parte de um Todo. Sinto-me dentro de um mar e o mar como o céu. Estou de cabeça para baixo. Estou de cabeça para cima. Minha pele coça. Há muitos insetos imaginários. Meu cabelo flutua no ar como se tivesse vida própria. Minha fala sai arrastada. Minha boca está torta. Meu pensamento está louco. Está sensato. Agora, sinto a natureza. Sinto o ar que respiro. Sinto esse sapo que está em minha mão. Converso com ele mentalmente. Ah, quantos ensinamentos! Quantas percepções! Caminho com curiosidade, como uma criança quando se depara pela primeira vez com o mundo! Ponto de exclamação, ponto de exclamação! O mundo está diferente. São outras realidades. Outras subjetividades. Meus olhos despertos analisam tudo, tudo! E, nada, nada! Tudo é tão irrisório. Tão belo. Tão mesclado. Tão enigmático. Tão profundo. Tão confuso.
      Me sinto num mar de percepções. Num mar. Como um peixe dentro d’água. Respirando água. Minha pele já não é tão formidável. Meu rosto não é mais rosado. Estou verde. Estou amarelo. Estou cor de areia. Sou areia. Sou pó. Sou carne. Sou sapo. Sou árvore. Sou cão. Sou folha. Sou Tudo. Sou Nada. Doce. Amargo. Salgado. Azedo.
      Uma espécie de extraterrestre. Uma espécie de criança. Uma espécie de pequenez do Nada. Sou a antena do mundo. Capto o que quero. Subjetividade. Percebo o que quero perceber. E, percebo, também, o que não quero perceber. Transformo o mundo. As coisas são modeláveis como uma. Massinha.
      Mas, meus desejos e meus medos ainda estão incontroláveis. Difícil controlar a libido que neste momento me vem de forma assustadora. Difícil controlar alguns desejos e medos. Desejos. Medos. Difícil segurar uma comida apetitosa quando se está com fome. Vejo ondas me engolir. Vejo mãos me hipnotizar. O prazer me dominar. E, o medo me enlouquecer. Mas, são ilusões. São invenções minhas. Desejos incontroláveis que. Na verdade. São suportavelmente controláveis.
      Meus Eu’s conversam entre si. Não só conversam entre si. Mas, berram entre si. Já tive uma experiência semelhante. Mas, não dessa forma. Exclamações! Sentimentos e raciocínios a flor da pele. Ah! Meus olhos começam a doer. Ah! Minha cabeça começa a latejar. Meu corpo já não aguenta tanta subjetividade. Tanta agitação mental. Meu corpo já não está mais se esvaindo. Agora está ressurgindo da perdição. Do negrume. Do fundo. Da. Escuridão. Não totalmente. Não parcialmente. Nem de forma mínima. Ou máxima. Nem tão pouco. Nem tão muito. Mas, ressurge de volta ao sonho. A ilusão. De toda individualidade. Competição. Ilusão do Ser. Dos conceitos. Das coisas. Da vida. Do sofrimento.
      E, pior, muito, muito pior. A ilusão do medo. Da morte. Da jaula. Do controle. Da mutilação e da tortura. Mental. Física. Medo da Verdade. Do falso Saber. Da falsa Filosofia. Da falsa Reflexão. Medo do sem sentido. Medo do sem rumo.
   

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