sábado, 20 de agosto de 2011

Abrindo a mente


       Caminhando em um trapiche. John, um filósofo e astrofísico que vivia sempre muito estressado com o trabalho e ocupado dando palestras e aulas, se encontrava por incrível que pareça sozinho em seus pensamentos. Observando o pôr-do-sol, onde refletia ao mar, ele quase se emocionava em ver algo tão perfeito e grandioso. Ele sempre passara todos os dias por esse local, mas nunca havia percebido o trapiche e aquela paisagem.
      Agora, ele não queria se preocupar com mais nada, apenas sentir o vento no rosto e só. Perto dali, um mendigo bastante enigmático e observador repara na expressão de John e perturbando seu silêncio o questiona:
     - Olá! O que você está pensando? - John, levando um enorme susto. E se equilibrando para não cair do trapiche, responde irritadamente.
     - Ai! Que susto você me deu! Não estou pensando em nada. Eu te conheço?- Com um sorriso misterioso, o mendigo responde.
     - Minhas sinceras desculpas pelo susto.
     - Você não respondeu minha pergunta. Eu lhe conheço?
     - Bem... Isso não vem ao caso. Pois você não me disse no que estava pensando. - John pensativo. Não entendendo do porquê este homem estar ali para perturbar seus pensamentos. Responde convicto.
     - Não estou pensando em nada! Poderia ir embora? Estou realmente ficando irritado!
     - Desculpe, não foi minha intenção. Mas só peço que me responda a uma pergunta pelo menos. - A fim de não ter outra opção, a não ser responder a dita pergunta, John aceita conversar com este anônimo.
     - Tudo bem, se você se mandar após a pergunta.
     - O que você desejar. Mas então, no que você estava pensando? Creio que sua mente neste momento esteja pensando quanta pertinência a minha. Mas pelo olhar em que você se encontrava e o modo como observava o mar, devia ser um pensamento deveras interessante. Se quiser que eu vá embora agora, tudo bem.
     - Não, tudo bem. Eu só estava imaginando o quanto a vida não faz sentido. Quer dizer, você acorda toda manhã, toma um café, vai trabalhar, namora, sai com os amigos para beber, volta para casa e vai dormir. Só isso. - Com uma voz um pouco exaltada, e observando o mar, continuou. - Caramba! Estamos flutuando no espaço, será que ninguém se dá conta disso? Será que as pessoas acham tudo isto perfeitamente normal? Aposto que você esteja pensando que sou louco ou algo assim. Mas você fez sua pergunta, teve sua resposta. Peço que vá embora agora! - O anônimo fitando-o, com um olhar orgulhoso, o surpreende.
     - Interessante pensamento , John. Era exatamente o que eu estava precisando ouvir de alguém como você.
     - Você sabe meu nome? - Dando poucas gargalhas, o misterioso homem responde.
     - E como eu não saberia? Se importa se eu fizer mais perguntas ? - Com uma expressão assustada, John aceita conversar mais com este anônimo. Mas o que ele queria saber mesmo, era como este homem o conhecia.
     - Tudo bem, mas insisto em saber quem o senhor é, e como me conhece.
     - Tenha paciência John, tudo tem seu tempo. Vamos começar. O que você pensa sobre o universo? Você acha que o universo é eterno, teria ele se criado a partir do nada absoluto? John, isto é naturalmente possível?
     - Bem, penso que estamos ainda na pré-história do entendimento do universo. Sobre achar que ele é eterno, não sei responder.
     - Ok, vamos a uma pergunta muito mais intrigante, John. Quem é você? O que você acha, sobre não poder determinar sua própria aparência? Ou pior ainda ainda não ter decidido ser uma pessoa? A final, o que é mesmo ser uma pessoa? - John, com um olhar confuso. Como se estivesse buscando sua resposta através de teorias, ou livros que vinham em sua mente. Seu cérebro, era como um computador, apenas armazenava pensamentos e lógicas de outras pessoas. Não pensava por si só. Talvez pudéssimos comparar sua mente com uma pessoa obesa e preguiçosa.
     - Nossa! Quantas perguntas.
     - Você não deve procurar quantas perguntas têm John, e sim em quantas respostas você deve achar. Todo dia quando você sair para beber, o que você ganha? Liberdade? Sair um pouco da rotina? Diversão? Não, nada disso. Você ganha apenas...Presta muita atenção no que vou dizer, você ganha apenas uma vaga sensação de felicidade. E quando vai dormir, o que sente? Você sente que algo está faltando dentro de você, um vazio, não é? John, vamos lá, não quero que justamente você passe a pertencer ao clube dos apáticos e indiferentes. Quero que você viva uma vida instigante!
     - Olha, sou um filósofo e astrofísico, sei de muita coisas. Com certeza mais que você, que é apenas um mendigo. Sei as perguntas que devo percorrer e as respostas que devo perscrutar, e se não durmo acredito que seja problema meu. E se você sabe tanto assim sobre mim e sobre a vida. Me responda se realmente existe um Deus. Vamos lá sr. Sabidão.
     - Não John, não sei nada. Minha opinião não importa, sou um mendigo, não está vendo? Mas e você acredita em Deus? Ou mais ainda acredita que ele teria também se criado a partir do nada?
     - Não. Realmente não acredito em Deus. Pra mim isto não passa de um conto para pessoas que tem medo do escuro.
     - E porquê você não acredita em Deus, John?
     - Acho essa história de Deus muito primitiva. E outra você já ouviu falar de Nietzsche, um grande filósofo. Na minha opinião ele revolucionou a filosofia, em afirmar "Deus está morto". Acredito na opinião dele, então para mim não existe. - O mendigo, com uma expressão profundamente preocupada, abaixa a cabeça e o pergunta.
     - Você é realmente um filósofo?
     - Mas, claro que sou! Quer ver meu diploma? Dou aula para uns jovens aqui perto. - O mendigo decepcionado, balbucia em voz baixa.
     - Coitado destes jovens.
     - Ei! Eu ouvi isso. Não sou ruim por não acreditar em Deus. Você é evangélico ou algo assim?
     - Não, não. Reclamei, porque... Bem porque você não é um filósofo de verdade, é um tremendo falsário.
     - Como você ousa dizer isso? Tenho meu diploma, estudei durante muito tempo. Sei muito mais que você, me pergunte qualquer coisa, vamos lá! - Ao ápice da irritação, John, pensa porque ele tinha que estar ali ouvindo sermão de uma pessoa que mora na rua, que não tem o mínimo de educação. Então a fim de trancafiar este mendigo em sua gaiola do pensamento, John queria mostra o quão sábio podia ser.
     - Já fiz minhas perguntas John, você não soube responder. Acho que minhas próximas perguntas, teriam respostas incrédulas como aquelas.
     - Respostas incrédulas? Quem é você, para me dizer isto?
     - A pergunta certa, não é quem eu sou e sim quem você é?
     - Ah sim, acho que já entendi. Através deste método socrático, você pretende ser um novo Sócrates, é isso?
     - Já estudei durante um longo tempo sobre Sócrates, ou melhor nós estudamos. Para falar a verdade você sabe quem eu sou. Mas, continuando, se você é um verdadeiro filósofo, porque fica em busca de opiniões formadas como a de não acreditar em Deus, por ser um pensamento de um grande filósofo? Tem medo do que você possa pensar? - Muito pensativo. John observa ao seu redor, e depois de um tempo, finalmente responde.
    - Não tenho medo. Não acredito, porque tenho amigos astronautas que já foram tantas vezes para o céu e nunca encontraram Deus, nem se quer sentiram sua presença. Por quê eu deveria acreditar, se ele nunca está no céu?
    - E o que você tem a dizer, sobre cirurgiões que abrem as cabeças, e nunca sequer, viram um pensamento? Quer dizer que pensamentos também não existem?
    - Nunca pensei nisso.
    - Talvez você não tenha pensado sobre muitas coisas, não é? - John, abrindo os olhos, e percebendo que suas respostas nunca seriam encontradas, seguindo respostas de outras pessoas. Que deveria apenas refletir sobre outros pensamentos, para ajudar a formular as suas. Descobrindo que não se pode aprender filosofia procurando sobre o quê pensar, e sim em como pensar, responde.
    - É... mesmo eu sendo um "filósofo", acho que eu estava vivendo cegamente. Estou me sentindo como um personagem da teoria de Platão, largando as sombras, largando a caverna. Você é muito inteligente, me ajudou muito. Mas agora me responda, como você sabe tanto sobre mim? Quem é você? - O enigmático mendigo respira profundamente, e responde.
    - Você me criou John, sou a sua consciência.
 
 
 

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